No “Estúdio”, o espaço dedicado à vida profissional e artística de Charlie Chaplin.
Depois de fugir dos Estados Unidos e do macarthismo, escondido durante horas numa suite do Queen Elisabeth, Charles Chaplin abandonou definitivamente a América, rumo à Europa, no dia 19 de setembro de 1952.
Aconselhado pelo seu meio-irmão Sidney, acabaria por se radicar na Suíça, em Corsier-sur-Vevey, numa mansão que o anterior proprietário denominou Manoir du Ban. Foi aí que viveu os seus últimos 25 anos, falecendo, ao que parece tranquilamente, durante o sono, no dia 25 de dezembro de 1977.
O jardim e a mansão onde Chaplin viveu durante a maior parte dos seus últimos vinte e cinco anos. Aqui cresceram 8 dos seus 11 filhos.
Depois da morte da mulher de Chaplin, Oona, em 1991, os filhos cederam a propriedade à Charlie Chaplin Museum Foundation que, em 2000, iniciou o projeto de construção, no local, do Chaplin’s World, um museu que nasceria apenas em abril de 2016.
Constituído por vários edifícios temáticos, além da mansão, este imenso espaço museológico comporta também um jardim, onde Charlie gostava de passar grande parte do tempo, quando estava em Corsier, um parque de estacionamento para centenas de carros, uma área de restauração e uma loja de souvenirs.
Todo o espaço museológico é interativo e extremamente interessante.
O ingresso custa 27CHF, mas pode ser comprado com antecedência, pela internet, por 19CHF. Quem for de carro terá de desembolsar ainda 5 CHF para o estacionamento. Apesar de não ser barato, vale cada minuto e cada cêntimo.
Quem quiser pode também visitar as campas de Chaplin e Oona, que se encontram, lado-a-lado, no cemitério de Corsier-sur-Vevey.
Desde o dia 12 deste mês (set. de 2021), as pessoas acima dos 12 anos precisam de um certificado de vacinação contra a Covid-19 para acederem ao Chaplin’s World.
Charlie dá-nos as boas-vindas à entrada da mansão, o espaço dedicado à sua vida pessoal e familiar.
Sobre a sua estadia em Corsier-sur-Vevey, escreveu o próprio Chaplin:
For the last twenty years I have known what happiness means. I have the good fortune to be married to a wonderful wife. I wish I could write more about this, but it involves love, and perfect love is the most beautiful of all frustrations because it is more than one can express. As I live with Oona, the depht and beauty of her character are a continual revelation to me. Even as she walks ahead of me along the narrow sidewalks of Vevey with simple dignity, her neat little figure straight, her dark hair smoothed back showing a few silver threads, a sudden wave of love and admiration come over me for all that she is – and a lump comes into my throat.
With such happiness, I sometimes sit out on our terrace at sunset and look over a vast green lawn to the lake in the distance, and beyond the laketo the reassuring mountains, and in this mood think of nothing but enjoy their magnificent serenity.1
Os jornais da época deram grande destaque à vinda da família Chaplin para a Suíça.
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Notas:
1Obra abaixo citada, p. 477.
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A nossa edição:
Charles Chaplin, My Autobiography, Penguin Books, London, 1964.
Mahler trabalhou na sua Segunda Sinfonia entre 1888 e 1894, e reviu-a em 1903.
Em dia de Páscoa deixamos um apontamento dessa magnífica obra mahleriana, a sinfonia nº 2, “Ressurreição” (em que, tal como nas sinfonias 3 e 4 – as chamadas Sinfonias Wunderhorn – intervem a voz humana), registado em Leipzig, Alemanha, no ano de 2011. O maestro é o carismático italiano Riccardo Chailly, que tivemos a felicidade de ver ao vivo noutras ocasiões. Páscoa Feliz!
Este vídeo beneficia de letra, música, interpretações e realização excecionais.
Em 1964, no final de um discurso célebre nas Nações Unidas, Che Guevara proferiu uma frase que se tornaria até hoje a palavra de ordem do regime cubano: “Patria o Muerte!” Cinquenta e sete anos depois, no início de 2021, um grupo de artistas cubanos lançou uma canção, cujo título não poderia afastar-se mais daquela célebre frase de Che: “Patria y Vida!”
O vídeo desta canção, menos de duas semanas após o seu lançamento, tem já mais de dois milhões e meio de visualizações no youtube. E, claro, a reação em Cuba foi imediata. Os órgãos do regime apressaram-se a denegrir o tema. Na televisão, o jovem apresentador Lázaro Manuel Alonso deixou claro que “Patria y Vida” não é uma expressão original, fora já usada por Fidel em 23 de dezembro de 1999, perante uma plateia estudantil. Por seu turno, o governo cubano promoveu uma campanha denominada “Morrer pela Pátria é Viver”, apelando aos cubanos para que cantassem e aplaudissem o seu hino nacional no dia 18 de fevereiro às 21:00, como resposta a “Patria y Vida”, que membros do governo classificaram de “trapaceira e cobarde” e os seus autores de “ratos” e “mercenários”.1
Tudo isso não impediu que este tema se tornasse viral em Cuba. Os depoimentos de vários jovens entrevistados em Havana pela agência Reuters, bem como inúmeros vídeos publicados nas redes sociais, provam-no. “Patria y Vida” transformou-se num símbolo da resistência ao regime, e o vídeo da canção foi profusamente divulgado nas redes sociais. A checa Dita Charanzová, vice-presidente do Parlamento Europeu, publicou-o na sua conta do Twitter, acompanhado das seguintes palavras: “Para que todo o mundo tome consciência da realidade cubana”.
Dita Charanzová é uma cidadã do mundo livre, atenta ao que se passa no mundo oprimido. No entanto, muitos dos nossos concidadãos ainda olham com simpatia ou indulgência para a ditadura cubana, talvez por a considerarem mais suave que outras ditaduras. Che Guevara e Fidel Castro são vistos como heróis de uma revolução que libertou o povo do jugo de Fulgêncio Batista, no primeiro dia de 1959. Mas o que talvez não saibam é que rapidamente Fidel Castro passou a governar baseando-se nos “ódio, poder e dinheiro”, tal como nos diz a insuspeita neurocirurgiã cubana Hilda Molina, que conviveu durante muitos anos com o próprio Fidel (foi pedida em casamento por ele). Hilda considera que Fidel era um “psicopata”2. De resto, os testemunhos sobre o ditador são inúmeros e estão acessíveis, basta procurá-los.
Mas não é suficiente ir de férias para Varadero, falar com os empregados dos hotéis, visitar os locais preparados (muitas vezes exclusivos) para os turistas e daí extrair um retrato de Cuba. É preciso contatar os cubanos comuns, aqueles que circulam pelas ruas e habitam nas casas degradadas de Havana; falar com eles, ganhar a sua confiança, perceber como vivem e, sobretudo, saber o que pensam, para se ter uma ideia mais precisa do que se passa no país.
(Há cinco anos e meio estivemos em Cuba. O relato sobre essa visita foi publicado neste blogue e pode ser lido aqui.)
Finalmente, o que importa perceber é que em decorrência de qualquer ditadura revolucionária em nome do povo há sempre um contraste abismal entre o ditador e esse mesmo povo: o primeiro vive sempre no luxo e na sumptuosidade; o segundo vive sempre na opressão e na miséria. Fidel Castro, por exemplo, esse grande Comandante de Cuba durante meio século, vivia sumptuosamente. Tinha uma ilha privada, inúmeros imóveis e uma fortuna imensa, calculada em dólares e não em pesos cubanos, proveniente de, na prática, ser dono das maiores empresas estatais cubanas e mentor de esquemas sofisticados de narcotráfico.3
A regra que determina a relação entre ditador e povo é válida para todas as ditaduras revolucionárias e, deste ponto de vista, não há gradação entre elas; não há — nunca houve até hoje na história humana — ditaduras revolucionárias suaves.
A construção do parlamento húngaro durou de 1885 a 1904. Aqui foram usados 40 milhões de tijolos, 500 mil pedras decorativas e 40 quilos de ouro. 242 esculturas decoram o exterior e o interior deste edifício neogótico. É o maior edifício da Hungria e o terceiro maior parlamento do mundo.
BUDAPESTE
São três capitais muito próximas[1], ligadas pelo rio Danúbio, perfeitamente visitáveis num fim de semana prolongado. Os voos diretos low cost entre Faro e Budapeste, operados pela companhia húngara Wizz, tornaram esta escapadela ao coração da Europa ainda mais irresistível. A nossa visita começou por uma cidade monumental. Em Budapeste, somos brindados com magníficas obras de arte por todo o lado, sejam edifícios, pontes ou esculturas. A parte mais interessante da cidade é a que fica junto ao rio, na margem oeste (Buda) ou leste (Peste), onde dois edifícios, respetivamente, se destacam: o Palácio Real e o Parlamento húngaro. O Palácio alberga o Museu de História de Budapeste, a Biblioteca Nacional Széchenyi e a Galeria Nacional Húngara. Foi nesta última que tivemos o ensejo de visitar uma exposição sobre Frida Kahlo e a sua obra, patente ao público aquando da nossa visita. Seguindo a história deste imponente palácio podemos acompanhar grande parte da atribulada história de Budapeste e da própria Hungria, um país no centro da Europa, ocupado por mongóis, turcos, austríacos, russos, alemães e soviéticos. O Castelo de Buda, como agora é mais conhecido o palácio, foi inicialmente mandado construir por Sigismundo de Luxemburgo (1368-1437), rei da Hungria e das Terras Checas, à época, um dos mais poderosos soberanos europeus. Mais tarde, sob o reinado de Matias I (1458-1490), foi ampliado dentro do estilo renascentista, mas a ocupação turca, de 150 anos, e a consequente reconquista de Buda (com a ajuda dos Habsburgos), em 1686, provocaram a sua destruição.
Pátio dos Leões, no Palácio Real.
Seguiu-se um período que ficou conhecido como a “Era das Reformas”, quando muitas edificações emblemáticas, como a Academia Húngara das Ciências, o Museu Nacional e a Ponte Széchenyi (“Ponte das Correntes”), foram erguidas. Porém, um conflito armado traria de novo a destruição; desta feita, a revolução contra os Habsburgos, de 1848. Só a partir de 1867, após um acordo com o Império dos Habsburgos, Buda e Peste conheceram um novo impulso, desta vez o maior de sempre. Na viragem para o século XX uniram-se para formar Budapeste, esta lindíssima cidade que conhecemos. Data desta época a construção do Parlamento, o maior edifício da Hungria, cujo projeto foi desenhado por Imre Steindl. Mas, uma e outra vez, o processo de desenvolvimento seria interrompido, primeiro pela Grande Guerra (1914-1918) e, um quarto de século mais tarde, pela II Guerra Mundial, quando os soviéticos bombardearam e destruíram mais uma vez o Palácio Real, onde os alemães se aquartelavam. Nessa altura, já Budapeste era conhecida pelos seus belos cafés e esplanadas, pelos banhos termais, pela vida noturna e oferta cultural e, claro, pelas extraordinárias obras de arquitetura e escultura espalhadas por toda a cidade, tal como hoje.
Exposição de e sobre Frida Khalo, na Galeria Nacional Húngara, em Budapeste.
Quem visitar Budapeste poderá encontrar, antes ou já no decurso da viagem, roteiros que invariavelmente incluirão, além dos referidos Palácio Real e Parlamento, as pontes sobre o Danúbio (Ponte das Correntes, Ponte Isabel, Ponte da Liberdade e Ponte Margarida), a Colina Gellért (onde fica a Estátua da Liberdade), o Palácio Sándor, a Catedral de São Matias, o Bastião dos Pescadores, os Banhos (Király, Rác, Gellért, Rudas, Veli Bej), o Museu Etnográfico, a Basílica de Santo Estevão, o Grande Mercado de Budapeste, o Bairro Judeu e a sua monumental sinagoga , a Baixa de Peste, o Jardim Botânico, o Palácio das Artes, a Praça dos Heróis, o Passeio do Danúbio (ao longo do qual podemos encontrar belíssimas esculturas), etc., etc., etc.
Em Budapeste há muito que admirar. E quando cai a noite, a cidade não perde beleza, antes ganha cambiantes de oiro que refletem dos edifícios sabiamente iluminados. É quando um passeio de barco ao longo do Danúbio nos parece mais apropriado. Para acabar a noite, nada melhor que um drink no Szimpla Kert, um edifício perto do bairro judeu[2] que alberga bares, restaurantes, galerias, discoteca, lojas, e onde atuam músicos diversos ou DJs, todos os dias.
No interior do Szimpla Kert.
A decoração, mais ou menos caótica, as paredes interiores cobertas por uma panóplia incrível de objetos, constituem uma atração suplementar. O próprio edifício apresenta uma fachada exterior ornamentada com mísulas entre os pisos, balaustradas sob as altas janelas e a varanda central, e pequenos frontões sobre as mesmas: além de robusto e clássico, é mesmo muito bonito. A rua onde fica o Szimpla Kert tem vários restaurantes e bares e toda esta zona tem grande animação noturna. Uma visita a este espaço é algo que o recém-chegado a Budapeste não pode perder.
VIENA
Por seu lado, Viena é igualmente uma cidade monumental. Partindo de Budapeste de comboio, atingimo-la em cerca de duas horas e meia. A primeira coisa que convém fazer ao chegar à cidade é comprar um título de transporte que permite circular durante 24 horas em qualquer transporte público de Viena, pela módica quantia de oito euros. Recomenda-se vivamente a utilização do metropolitano, que é rápido, abrangente e de alta frequência.
Belvedere superior, Viena.
A nossa primeira paragem foi no Palácio Belvedere[3], um conjunto formado por dois edifícios principais e um parque histórico, desenhado no começo do século XVIII pelo prestigiado arquiteto Johann Lucas von Hildebrandt e considerado um dos conjuntos barrocos mais belos do mundo. Era residência de Verão do general austríaco Príncipe Eugénio de Saboia e é hoje parte do Património da Humanidade da UNESCO. A nossa visita incidiu sobre o Belvedere Superior, originalmente espaço de representação (o príncipe vivia no Belvedere inferior), agora espaço que alberga algumas das mais importantes pinturas do mundo, integradas numa coleção que inclui vários milhares de peças.
Desde logo, os quadros de Gustav Klimt, Egon Schiele e Oskar Kokoschka, mas igualmente obras de outros autores austríacos, desde a Idade Média até aos nossos dias. E obras de Rodin, Monet, Manet, Van Gogh, Renoir, entre muitas outras. Uma manhã (ou tarde) inteira não é muito tempo para apreciar as belezas deste espaço que, nem seria necessário dizê-lo, são imperdíveis.
O famoso “Beijo”, de Klimt, a maior atração do Belvedere Superior.
Depois de Belvedere[4], ocupámos o nosso tempo à procura de locais relacionados com a vida de Karl Popper, nascido nesta cidade de Viena em 1902, uma tarefa que não se afigurou muito fácil. Constatámos, com alguma surpresa, que a maioria dos vienenses com quem falámos não conhecia Karl Popper[5]. Mesmo assim, conseguimos estar na rua onde ficava a casa em que viveu grande parte da infância, no liceu que tem o seu nome e na universidade de Viena, que frequentou. Por vezes, é muito interessante conhecer uma cidade através dos locais onde uma pessoa que admiramos viveu… A Universidade de Viena é particularmente interessante, com o seu enorme átrio sob cujas arcadas figuram bustos dos proeminentes alunos que ali estudaram (e são imensos!), Popper incluído.
Da Universidade rumámos ao coração de Viena, à praça onde se ergue a magnífica catedral de Santo Estevão. Nesta praça e nas suas imediações encontram-se muitos dos charmosos cafés de Viena, onde o viajante pode retomar o fôlego para nova caminhada.
Busto de Popper na Universidade de Viena.
Assim, da Stephans-Platz seguimos a pé até ao imponente palácio Hofburg, centro do poder dos Habsburgos, soberanos do Ducado da Áustria desde o século XII até o século XX[6]. Tudo aqui é grandioso. O palácio em si mesmo, com as suas mais de 2.600 salas, a Heldenplatz, para onde fica virado, os grandes jardins, a estatuária, o trabalho arquitetónico. O Palácio Hofburg, residência oficial do Presidente da Áustria, foi, como já dissemos, ocupado durante séculos pelos Habsburgos, era a sua residência de Inverno. Quisemos conhecer também a residência de Verão e, para isso, tomámos o metro e rumámos ao Palácio de Schönbrunn. Como seria de esperar, deparámo-nos com mais um conjunto (edifícios, estátuas, jardins) imponente. O Palácio de Schönbrunn, em estilo barroco, é realmente muito belo. Com esta visita a Schönbrunn terminou também a nossa visita a Viena. O comboio que nos transportaria a Budapeste já vinha a caminho. Quem disse que num único dia não se pode ver muito de uma cidade?
Palácio de Schönbrunn. Aqui se realizam, ao ar livre, magníficos concertos de Verão.
BRATISLAVA
Da nossa “sede”[7], em Budapeste, demos um salto de 200 quilómetros, desta feita de autocarro, a outra capital europeia, Bratislava. Esta cidade não tem a monumentalidade de Budapeste ou de Viena. Isso torna-se óbvio quase de imediato. Tal não surpreende, pois a Eslováquia, um pequeno país que na sua forma atual tem apenas 27 anos, foi sempre um território integrado num país ou império maiores. Fez parte do Reino da Hungria e depois, quando este integrou o Império Austro-Húngaro, passou a ser parte também desse império. Após a dissolução deste, em decorrência da Primeira Guerra Mundial, checos e eslovacos criaram a Checoslováquia, que duraria até 1993, quando os dois países se tornaram independentes, após o processo da “Revolução de Veludo”. Pelo meio, entre 1939 e 1945 (Segunda Guerra Mundial), ainda existiu uma república eslovaca supostamente independente, mas na realidade um estado fantoche controlado pelos nazis. De ascendência eslava, os eslovacos são um povo resiliente que tem desenvolvido enormemente o país desde a independência e, sobretudo, desde a sua integração na União Europeia e, posteriormente, na Zona Euro. É um dos países mais igualitários do mundo em termos salariais, apenas superado pelas Ilhas Faroé[8].
Praça do Município Velho, no centro histórico de Bratislava.
Percorremos Bratislava a pé. Do terminal rodoviário ao centro, e volta. A cidade é muito mais pequena, muito mais tranquila e muito menos turística que Viena ou Budapeste. Sendo uma capital europeia há menos de trinta anos, não pode ter a grandeza de outras que o são há séculos. Mas, mesmo assim, Bratislava tem os seus encantos. Na zona histórica sobressai a Praça do Município Velho, com os seus cafés e esplanadas. Não muito longe (tudo em Bratislava é perto), no topo de uma colina sobranceira ao Danúbio, destaca-se o Castelo de Bratislava, residência do presidente da República, cuja construção se iniciou ainda no século X. Daqui, a 85 metros de altura, pudemos desfrutar de uma bela vista sobre o centro da cidade e o Danúbio, lá em baixo. Na volta, fomos observando as esculturas que ornamentam muitas das ruas do centro histórico e são uma atração da cidade. Finalmente, entrámos no Palácio Pálffy, onde se encontra a Passagem de Matej Kren, que suscita a ilusão de um espaço infinito de livros. Um espaço infinito de livros na Terra e um espaço infinito de estrelas no Céu. Assim terminou a nossa viagem.
Passagem Matej Kren, em Bratislava.
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Notas:
[1] Viena e Bratislava são as duas capitais mais próximas do mundo, separadas por apenas 65 quilómetros de estrada.
[2] A grande Sinagoga Dohani, a segunda maior do mundo, fica no bairro judeu de Budapeste.
[3] Uma entrada no Belvedere superior custa €22,00.
[4] O palácio foi vendido pelos herdeiros do príncipe Eugénio a Maria Teresa da Áustria, que o batizou de Belvedere (“bela vista”, em italiano).
[5] Outros vienenses ilustres, cujas ideias Popper combateu, são mais populares em Viena, na Áustria e, provavelmente, no mundo. Referimo-nos sobretudo a Freud e a Wittgenstein. O primeiro tem mesmo um museu com o seu nome em Viena.
[6] A Primeira Guerra Mundial, grande destruidora de impérios, não poupou o Império Austro-Húngaro.
[7] Ficámos quatro noites hospedados no Capital Guesthouse Budapest, por €137,00. A localização é boa, muito perto da estação ferroviária e relativamente perto do Danúbio e do centro histórico, e a relação qualidade-preço é bastante aceitável.
Se fosse viva, Amália teria completado 100 anos no dia 1 de julho último, pois, dizem, ela nasceu nesse dia, no ano de 1920. Amália, porém, só foi registada uns dias mais tarde, há precisamente cem anos (23/7/1920), e o 23 de julho era o dia em que gostava de comemorar o seu aniversário (há quem diga que Amália queria ser”Leão” e não “Caranguejo”), pelo que permaneceu como data oficial. Escrevemos já dois artigos neste blogue sobre Amália — aqui e aqui — e não vamos dizer muito mais. As palavras são sempre escassas, ficam sempre aquém, e o melhor é mesmo ouvi-la. Amália Rodrigues, reconhecida no estrangeiro e não só em Portugal, cantou dentro de muitos géneros musicais, não apenas fado, embora tenha sido no fado — e dentro deste nos fados não tradicionais compostos por Alain Oulman — que encontrou a sua expressão mais alta. A cumplicidade artística entre ambos (para nosso deleite) está bem patente no vídeo que aqui deixamos, a nossa singela homenagem a Amália, no dia da evocação dos cem anos do seu nascimento.
Ensaio de “Soledad”, uma música de Alain Oulman com letra de Cecília Meireles.
“Brother and Sister”. George Town é uma cidade fotogénica.
Provavelmente será um dos nomes mais comuns de cidades em todo o mundo. Nós próprios já estivéramos noutra Georgetown, a capital das ilhas Caimão, mas esta, em particular, apesar de igualmente situada numa ilha, é a capital da província de Penang, na Malásia, que, “em reconhecimento da preservação histórica e cultural”, passou, juntamente com Malaca, a ser considerada Património Mundial UNESCO em Julho de 2008. Estas cidades situam-se no Estreito de Malaca, uma passagem marítima estratégica, desde há muitos séculos.
“Old Motorcycle”, de Ernest Zacharevic.
Quando, em 1511, Afonso de Albuquerque conquistou Malaca, esta era o ponto mais ocidental até onde navegavam os marinheiros chineses (muitos dos quais aí se instalaram na chamada Colina Chinesa), e para onde navegavam igualmente, mas em sentido contrário, indianos, persas e árabes para comprarem sedas e porcelanas. Hoje, mais de cinco séculos depois, o Estreito de Malaca, com 800 kms de comprimento e, no ponto mais estreito, apenas 3 kms de largura, é vital para a China, pois é por lá que passam os navios oriundos do Golfo Pérsico, carregados do petróleo de que este país tanto necessita. Continua, pois, a ser uma zona nevrálgica do globo, onde muitos interesses se cruzam.
“Brother and Sister on Swing”, de Louis Gan.
Para assinalar a passagem de George Town a Património Mundial, o governo malaio decidiu promover uma competição destinada a encontrar a melhor proposta artística para as ruas da zona histórica da cidade. O vencedor foi o coletivo Sculpture at Work, que apresentou, em 2012, uma série de 52 caricaturas em ferro, intitulada Marking George Town, as quais narram, em imagens, episódios da história do burgo. Os criadores foram Tang Mun Kian, Baba Chuah, Reggie Lee e o consagrado autor de banda desenhada malaio, Julian “Lefty” Kam. Estas peças fazem parte de um roteiro que foi sendo enriquecido com obras de outros artistas, nomeadamente, do lituano Ernest Zacharevic, com o projeto Mirrors George Town.
“Kids on Bicycle”, na Lebuh Armenian, é considerado o melhor trabalho, em George Town, de Ernest Zacharevic.
Os trabalhos de Zacharevic em George Town são uma combinação de objetos com pinturas, permitindo aos visitantes interagir com as obras. Os modelos retratados, normalmente crianças, são pessoas reais da população local. Um mapa com indicação dos pontos onde se podem ver estes trabalhos está disponível em vários pontos turísticos de George Town. Foi com um exemplar na mão que percorremos toda a cidade. Nessa altura não sabíamos que Ernest Zacharevic já estivera em Lisboa, em 2015, na inauguração da sua terceira exposição individual (a primeira na Europa), The Floor is Lava, na Galeria Underdogs.
Uma das 52 caricaturas em ferro das paredes da cidade. “Para consternação dos paroquianos da Igreja Portuguesa, a rua da Igreja também abrigava a sede da sociedade secreta Ghee Hin”. Como se vê, os portugueses não foram esquecidos.
É patente em George Town um contraste harmónico entre as culturas chinesa, indiana e malaia. Existe tolerância religiosa. A população é simpática e pacífica, como simpático é o custo de vida, realmente acessível, nomeadamente no que toca à alimentação e ao alojamento. Vale seguramente a pena visitar os templos Kuan Yin (budista), Sri Mariammam (hindu) e Kapitan Keling (muçulmano), bem como o forte Cornwallis e o templo do clã chinês Khoo Kongsi, entre muitos outros locais de interesse.
“Little Boy with Pet Dinosaur”, na Ah Quee Street, ainda um trabalho de Ernest Zacharevic.
A zona histórica está concentrada junto ao porto e pode ser percorrida a pé, mas, com calor intenso, talvez seja aconselhável fazê-lo no início ou no final do dia. Outra forma interessante de circular é alugando uma bicicleta; pode também apanhar-se o Cat Bus, e fazer uma viagem grátis em torno da cidade. Quem quiser hospedar-se com estilo pode ficar no Eastern & Oriental Hotel, um palácio colonial convertido em hotel de cinco estrelas, onde se pode tomar um magnífico pequeno-almoço debruçado sobre o mar. Por tudo isto, sobretudo para os amantes da street art, vale a pena visitar George Town, uma cidade histórica, colorida e verdadeiramente fotogénica.
Documentário sobre Daniil Trifonov, um pianista que já ouvimos ao vivo, realizado por Christopher Nupen.
Christopher Nupen é um documentarista sul-africano que se dedicou a realizar (e produzir) filmes sobre músicos. Ele próprio quis ser músico, e teve aulas de guitarra clássica com Andres Segóvia, tal como John Williams (não o compositor americano, mas o guitarrista australiano), o mais famoso aluno do famosíssimo mestre.
Foi através de Williams que Nupen conheceu vários músicos importantes, como Daniel Barenboim, Jacqueline du Pré e Vladimir Ashkenazy, todos ainda muito jovens, pouco conhecidos, mas cheios de talento; tornou-se amigo deles e decidiu começar a gravar a música que tocavam, primeiro para a rádio e depois, convidado por Huw Wheldon, para a BBC Television.
Assim nasceu o seu primeiro filme, Double Concerto, com os pianistas Ashkenazy e Barenboim (gravado com as novas câmaras silenciosas de 16 mm, desenvolvidas nos anos sessenta), que logo venceu dois prémios internacionais (Praga e Monte Carlo). Mais tarde, em Cannes, Chris receberia também o prémio para o melhor DVD do ano (2005), com Jacqueline du Pré in Portrait, troféu que voltaria a conquistar em 2006, com We Want the Light, (título extraído de um poema escrito por uma menina de 12 anos, Eva Pickova, no campo de concentração de Theresienstadt), um documentário que explora a complexa relação entre judeus e música alemã.
Christopher Nupen estabeleceu com a maioria dos músicos uma relação de amizade, e isso permitiu-lhe realizar filmes profundamente biográficos e intimistas, e muito belos.
Seria fastidioso citar todos os super-talentos retratados por este magnífico realizador. Podemos encontrá-los em DVDs que valem cada cêntimo que possamos gastar. A nonagésima quinta produção é sobre Daniil Trifonov, um jovem russo de 24 anos que Martha Argerich (ela também retratada num documentário de Nupen) considera o melhor pianista de sempre.
Jacqueline du Pré ganhou o seu primeiro violoncelo aos 4 anos de idade. A partir daí, passou a viver em dois mundos – aquele em que era uma criança como todas as outras e um outro em que só existiam ela e o seu violoncelo. Com o tempo, Jacqueline tornou-se uma instrumentista fantástica, mas a sua carreira seria interrompida aos 28 anos, devido à esclerose múltipla que lhe haviam diagnosticado. As últimas atuações foram dramáticas. Conduzia com o olhar os próprios dedos, isentos de sensibilidade. Jackie morreu em 1987, aos 42 anos. É uma figura cativante, uma das maiores da história da música.
O pianista Paul Wittgenstein, irmão mais velho do filósofo Ludwig, perdeu o braço direito na Grande Guerra, onde ambos combateram. Maurice Ravel escreveu este concerto tendo em conta a mão esquerda (e única) de Paul. A interpretação que aqui apresentamos está a cargo da Filarmónica de Zagreb, com Brigita Vilc ao piano.