Córdoba, Granada e Gibraltar

IMG_8758
Jardins do Alcazar dos reis cristãos, em Córdoba.

Do sul de Portugal é facílimo dar um salta à Andaluzia, ali mesmo ao lado,  e conhecer belas cidades como Huelva, Sevilha, Cádiz, Málaga, etc. Nesta pequena viagem de três dias optamos por duas cidades espanholas, Córdoba e Granada, e uma do Reino Unido – um verdadeiro espinho cravado no corpo de Espanha – Gibraltar.

Algo ressalta, desde logo, quando se termina uma viagem por estes três lugares, geograficamente bem próximos: o seu passado árabe. De facto, Córdoba foi no século X sede do esplendoroso califado Omíada, Granada foi o último reduto árabe na Península Ibérica, e Gibraltar foi o lugar onde, em 711, o berbere Tariq ben Ziad desembarcou com sua tropas e abriu caminho para os árabes conquistarem a Ibéria. São, por isso, cidades não apenas históricas, mas também carregadas de simbolismo.

IMG_8764
Pormenor de uma porta, em Córdoba.

Em Córdoba visitámos a Judiaria, a Mesquita-Catedral, a Alcazar dos reis cristãos, a ponte romana, a rua das Flores e a estátua de Maimónides. Este é o nome grego do  rabino, professor, mestre, filósofo e médico judaico, Moshe Ben Maimon. A sua vasta obra, ainda hoje estudada e comentada, teve e continua a ter um impacto tão importante na religião judaica que ficou célebre o epitáfio medieval que dizia: “Desde Moisés (da Bíblia) até Moisés (Maimónides) não houve ninguém como Moisés”1

Por seu turno, Granada é uma cidade maravilhosa. O bairro antigo e árabe, chamado Albaicín, é encantador. Subindo-o, desde o centro da cidade, pode observar-se, na colina oposta, tendo por trás a Serra Nevada, a célebre Alhambra, que inclui um castelo cristão, um complexo palaciano e fortaleza de origem árabe, da dinastia Nasrida, e ainda jardins e hortas circundantes, a que chamam Generalife.

IMG_9232
Azulejo do palácio árabe de Alhambra, em Granada.

Em Albaicín, a comparação com Alfama é quase inevitável. E, lamentavelmente para nós, Alfama fica a perder. Albaicín é muito mais limpo e preservado. As suas casas com pátios, interiores ou exteriores, sempre floridos, são muitas vezes autênticos miradouros de onde os olhos pousam e repousam sobre a cidade. Claro que o pequeno rio Darro que corre entre as colinas de Alhambra e Albaicín não tem a grandiosidade do Tejo. Mas só talvez se um dia Alfama se tornar património mundial, a gente possa aqui viver com o orgulho que se sente em Granada.

Por fim, Gibraltar: um daqueles lugares que fascinam geólogos, físicos e outros cientistas: uma montanha de rocha calcária elevada do fundo do mar pelas forças descomunais da Natureza. Gibraltar pertence ao Reino Unido desde 1713, ano em que os espanhóis cederam o território à Inglaterra, a título perpétuo, após a Guerra da Sucessão.

IMG_9235
Pormenor de coluna no palácio árabe de Alhambra, em Granada.

Subir o rochedo de Gibraltar não deixa de ser uma aventura, mesmo que o façamos de carro, como foi o nosso caso. A estrada é estreita e íngreme, e o esforço a que obrigam os troços que têm de ser feitos a pé é compensado com vistas deslumbrantes em todas as direções, destacando-se as montanhas do norte de África (o Atlas) que se impõem a Sul. Pelo caminho vêem-se famílias inteiras de macacos da berberia, tão habituados aos turistas, que chegam a posar para as fotografias. Como o nome indica, foram aqui introduzidos pelos berberes e são hoje protegidos pelo governo local.2

Neste percurso ascendente – que é a principal atração turística do rochedo – podem visitar-se grutas, castelos e monumentos, mas o mais impressionante são sem dúvida os túneis cavados na rocha pelos britânicos, aquando do grande cerco feito pela Espanha (1779-1883) e também durante a II Guerra Mundial. Um dos túneis corta o rochedo de sul para norte, tendo pelo meio aberturas que deixam passar apenas o olhar humano (por vezes ajudado por binóculos) e os canos dos canhões. Dali é possível controlar o território espanhol, a baía de Algeciras e o próprio Mediterrâneo.

IMG_9536
Gibraltar. Ao fundo, África.

Gibraltar e o monte Musa, em África, constituíam na Antiguidade as chamadas Colunas de Hércules. Entre elas ficava uma porta para o desconhecido3, – uma passagem que liga o Mediterrâneo ao Atlântico e onde passa hoje um navio a cada seis minutos. Não é difícil calcular a importância estratégica de Gibraltar. Nem surpreende que tanto o Reino Unido quanto os gibraltinos não queiram abrir mão deste simbólico território.

**************************************************

Notas:

1 “Raízes dos Judeus em Portugal”, Inácio Steinhardt.

2 De acordo com a lenda, o Reino Unido perderá Gibraltar quando o último macaco desaparecer. Não admira, por isso, que os macacos sejam protegidos.

3 De facto, como o próprio nome indica, o Mediterrâneo era o centro do mundo. Para além, ficava o desconhecido.

**************************************************