
A presença humana na Ria Formosa é muito antiga. Os romanos fundaram aqui uma das maiores cidades da Hispânia, Balsa, e antes deles já fenícios e cartagineses se haviam instalado no mesmo local. Os restos dessa cidade encontram-se debaixo de terra, na Torre d’Aires, mas há outras evidências à superfície que confirmam a posição estratégica da ria: as fortalezas dos Cavaleiros de Santiago, em Cacela, e de São João da Barra, em Cabanas, e o já muito arruinado forte de Santo António, em Tavira, foram construídos nesta zona porque os navios que contornavam a costa, oriundos do Mediterrâneo, tinham de passar por aqui.

Para lá da posição estratégica, toda a zona do Parque Nacional da Ria Formosa foi, e é, igualmente importante do ponto de vista económico. As armações de atum, vitais para as populações do Sotavento durante os séculos XIX e XX, sobretudo para as famílias que, em comunidade, ocupavam os arraiais, foram também fonte de rendimento para trabalhadores e trabalhadoras da indústria conserveira. O cemitério de âncoras, no Barril, é um vestígio icónico desses tempos, quando os incríveis cães d’água (raça hoje reconhecida como “cão d´água português”) ainda ajudavam na faina.

A extração de sal, com certeza muito antiga, manteve-se até hoje; e a flor de sal de Tavira, usada pelos mais afamados cozinheiros de todo o mundo, é de qualidade superior. Outro produto típico da Ria Formosa são as ostras, que beneficiam do movimento das marés e do sol algarvio para ganharem uma especial depuração. As mais famosas são as do Moinho dos Ilhéus, exportadas para vários países e disponíveis para degustação no restaurante Noélia e Jerónimo, em Cabanas, um dos melhores locais para comer em Portugal; e as mais populares são as dos viveiros da Fábrica, que se podem provar na Casa da Igreja, em Cacela (talvez na volta da praia, como manda a tradição).

Daí, do magnífico miradouro de Cacela Velha, podemos distinguir, entre ria e mar, uma língua de areia fina e comprida, que se estende até ao Barril — são as melhores praias da Europa! E, por todo o lado, arbustos, árvores, flores e frutos tipicamente mediterrânicos: não apenas a tríade figo, alfarroba e amêndoa, mas também citrinos, nêsperas e medronhos, entre muitos outros. Nas salinas, as aves são tão variadas que, só por elas, já vale a pena sair de casa: flamingos, mergulhões, garças, maçaricos, patos bravos, pernilongos, corvos marinhos e a raramente avistada galinha sultana (caimão), símbolo do Parque. No mar, sempre generoso, os melhores peixes e mariscos.
Pura sorte, nestes tempos de confinamento, termos, a dois passos, esta ria tão singular, onde na última década cientistas da Universidade do Algarve salvaram da extinção o icónico cavalo marinho!
Sempre diferente, sempre formosa.

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