
O homem é um animal violento, tal como a maioria dos seus primos primatas, sendo que a agressividade humana ultrapassa largamente tudo o que qualquer outro animal é capaz de fazer. Graças às suas linguagem e inteligência, o homem é o único ser vivo que mata membros da sua própria espécie por puro sadismo e até por mera diversão.
A velha questão sobre a origem da violência humana — se é inata ou adquirida — está há bastante tempo resolvida. Somos, sim, naturalmente violentos — e os genes da agressividade estão inscritos no nosso ADN. Vários estudos convergem para este diagnóstico: a observação de outros primatas, a descoberta de ossadas e utensílios com milhares de anos, o acompanhamento de povos que vivem em regiões isoladas do globo, e a investigação levada a cabo por várias disciplinas científicas, com o uso de tecnologias de ponta, incluindo a que permite a observação da atividade cerebral, como sejam as imagens obtidas por ressonância magnética funcional (RMf).
Aceitar a realidade da nossa natureza não nos deve impedir de lutar contra ela, antes pelo contrário. A luta pelo controlo da Natureza faz parte da nossa história — é sobretudo para isso que serve a Ciência — e a luta contra a nossa própria natureza é talvez a mais difícil e a mais desafiadora.
No entanto, na esperança de que escapemos ao que os rousseauianos consideram um “determinismo biológico”, há quem negue o caráter evolutivo da nossa agressividade. Esta perspetiva tem-nos conduzido a tentativas radicais de mudança da sociedade, mesmo que para isso seja preciso uma revolução (e muita violência), uma vez que destruindo as instituições que tornam o homem mau, emergirá o homem naturalmente bom.
Uma perspetiva completamente diferente é a dos que reconhecem a violência humana, e por isso destacam o papel das intituições liberais e democráticas no seu controlo, em particular no que toca à violência mais letal — a guerra que vem ceifando a vida de milhões e milhões de seres humanos inocentes. Um homem que mate outro é justamente condenado, mas um ditador que mate milhões passa frequentemente impune. Isto é possível porque só o homem é capaz de se associar em coligações de agressão proativa, nas palavras de Richard Wrangham.
Só reconhecendo que estamos sempre sujeitos ao surgimento de líderes violentos e criminosos capazes de arregimentar e comandar essas coligações, poderemos prevenir-nos, zelando todos os dias pelas instituições capazes de controlá-los e afastá-los do poder.
Os rousseauianos, mas também os marxistas, que em geral são as mesmas pessoas, tendem a desvalorizar o papel das instituições democráticas no que diz respeito à prevenção da violência e da guerra, referindo, com razão, que muitas democracias liberais também são belicistas.
Esquecem-se, porém, de que o caminho para a paz é longo, árduo e tortuoso (faz parte da luta referida acima). Nesse processo há países mais avançados, com os estados do Norte da Europa à cabeça, mas também há, além disso, uma correlação direta e positiva entre democracia e paz: os países mais democráticos são igualmente os mais pacíficos.
Esta correlação está sempre presente no espírito dos membros do Comité Nobel Norueguês e corresponde a uma posição pragmática e tanto quanto possível objetiva que, obviamente, não agrada à maioria dos crentes das ideologias radicais.
Aqueles que admitiam ser possível a atribuição do Nobel da Paz a um pseudodemocrata como Donald Trump não conhecem os critérios de decisão, nem o espírito que norteia a ação, do Comité Nobel Norueguês.
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