
Os Estados Unidos vêm intervindo militarmente um pouco por todo o mundo pelo menos desde a Primeira Guerra Mundial, sem contar com o período expansionista anterior. Além disso, os Estados Unidos intervieram também em variadíssimos países através da espionagem, do apoio político e financeiro a governos ou oposições com eles alinhados, incluindo a eliminação de políticos considerados inconvenientes. O rol é extenso e a América é considerada por muitos o pior país do mundo, o maior financiador de guerras e o mais letal, sendo o único que até hoje utilizou sobre populações indefesas duas bombas atómicas.
A ação dos americanos na Guerra Fria, de facto, uma guerra escaldante e terrível, motivada pelo medo, foi também muito negativa. O medo do comunismo fez com que os Estados Unidos fomentassem golpes militares, financiassem grupos armados e permitissem que se instalasse internamente um período negro que ficou conhecido por macarthismo. Uma verdadeira paranóia. A ação americana na Guerra Fria constitui, por isso, uma das principais razões do antiamericanismo. E embora a luta dos Estados Unidos fosse compreensível e, para aqueles que acreditam na liberdade, inteiramente justa, os meios usados, como acontece na maioria das guerras, foram um verdadeiro desastre.
Esse desastre provocou uma justificada hostilidade à América e, tendo em conta que os Estados Unidos são uma democracia liberal, houve quem desenvolvesse uma injustificada hostilidade ao sistema democrático, à ordem liberal e, amiúde, a todo o Ocidente. Esta hostilidade mais radical levou alguns a considerarem que todas as guerras em que os Estados Unidos se involvem são injustas, logo, é sempre justo estar do lado de quem se opõe aos americanos. Para quem adota, por princípio, este tipo de postura pouco importa o monstro que tenha de engolir: Estaline, Mao, Fidel, Putin ou Khamenei. Quando confrontados com tais personagens, os antiamericanos usam invaravelmente os termos do relativismo: alguns desses ditadores até podem ser maus, mas os americanos são ainda piores.
Isto equivale a dizer que a América é o mal absoluto, a fonte de todos os problemas do mundo, enquanto todo o restante mal, que também o há, claro, é relativo: eis o antiamericanismo primário. Mas serão os Estados Unidos, de facto, o pior país do mundo?
Ao longo da História sempre houve povos mais poderosos que outros. Por diversas razões, esses povos sempre exerceram o poder da força: ou porque eram atacados, ou porque queriam conquistar território, ou porque queriam impor a sua cultura aos demais, ou porque eram ambiciosos ou, simplesmente, porque podiam. Também houve alguns líderes poderosos pacíficos, mas isso só aconteceu em períodos em que o mundo estava ainda segmentado, não havia outros povos igualmente poderosos por perto, e o governante podia dedicar-se em exclusivo ao seu próprio povo. Mas nunca houve, que se saiba, um período de paz que abrangesse o mundo inteiro, sendo que a situação se agravou com o desenvolvimento dos transportes, com a facilidade de movimentar a máquina de guerra de um ponto do globo para outro.
Desde pelo menos a época dos Assírios que sempre houve impérios poderosos. Romanos, Árabes, Mongóis, Otomanos, Espanhóis, Holandeses, Franceses, Britânicos — todos foram expansionistas e dominadores nas suas zonas de influência. A partir da Grande Guerra (1914-18), os países, os chamados estados-nação, substituíram-se aos impérios. As grandes potências militares que emergiram da Primeira Guerra Mundial iriam confrontar-se na Segunda: Estados Unidos e Japão — hoje aliados.
Nunca houve, portanto, um período histórico sem potências dominantes. No último século, o papel de potência dominante (excetuando, talvez, o período da Guerra Fria) tem cabido aos Estados Unidos. E dado que a História nos mostra que não há vazios de poder, qual a potência alternativa seria melhor para o mundo? A resposta tem de ser procurada entre os potenciais inimigos dos americanos: Rússia, China, Coreia do Norte, Irão?
Desde logo, há que ter em conta que nestes países — todos autocracias — é muito mais fácil mobilizar o povo para a guerra. Com a comunicação social e as redes sociais controladas, bem como os tribunais e o sistema educativo, é fácil doutrinar toda a população contra o inimigo: previsivelmente, o malévolo Ocidente e o seu representante máximo, os Estados Unidos. A guerra poderia ser feita sem contestação.
Nos regimes democráticos, pelo contrário, os líderes políticos necessitam de aprovação de diversos tipos para fazer a guerra — desde maiorias parlamentares até à adesão da opinião pública. Apesar de ser desvalorizado por muitos, o tipo de regime está intimamente ligado à política externa e não é teoricamente aceitável, nem está experimentalmente comprovado, que uma Autocracia seja mais pacífica, pelo menos no longo prazo, que uma Democracia. Quem oprime os seus em casa não pode libertar os vizinhos.
Os Estados Unidos vieram em socorro da Europa nas duas guerras mundiais e na última Administração Biden fizeram frente ao ditador Putin, ajudando os ucranianos. Não são uma democracia perfeita, mas, embora com oscilações (e que grande “oscilação” é Trump!), têm melhorado continuamente. Apesar dessas melhorias são serem suficientes, enquanto se mantiverem uma democracia continuam a ter condições para melhorarem. O que não acontece com as outras superpotências militares, enquanto se mantiverem ditaduras. É por isso que os Estados Unidos são, por ora, a potência menos nociva para o Mundo.
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